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Médicos, gestores e justiça debatem a incorporação de novas tecnologias no I Fórum de Neurologia do CFM

Os dilemas enfrentados pelos médicos na indicação de procedimentos que ainda não são reconhecidos pelas entidades governamentais, o papel das agências reguladoras e a atuação do judiciário permearam as discussões realizadas no I Fórum de Neurologia e Neurocirurgia, realizado na manhã desta sexta-feira (2), na sede do Conselho Federal de Medicina (CFM), em Brasília. O evento teve o objetivo de debater a incorporação de novos procedimentos e terapias em saúde.

 O primeiro palestrante, o professor da faculdade de medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo Wilson Marques Júnior, relatou as dificuldades de tratamentos de pacientes neurológicos no Sistema Único de Saúde (SUS), como a impossibilidade de prescrição de tratamentos não cobertos pelo poder público. Segundo o palestrante, os neurologistas estão sendo proibidos, no sistema público, de solicitar exames genéticos, sendo que boa parte das doenças tratadas por esses profissionais são de origem genética. A apresentação pode ser acessada aqui.

“Esses dilemas colocam uma responsabilidade muito grande sobre o médico, quando deveria ser do sistema de saúde. Não  podemos arcar com uma responsabilidade que não é nossa”, argumentou. Durante o debate, o neurologista Luiz Antônio da Costa Sardinha defendeu que os órgãos públicos digam claramente o que não pode ser prescrito. “Da forma como está, o médico fica com a responsabilidade final”, relatou.

O neurocirurgião da Santa Casa de São Paulo José Carlos Esteves Veiga fez um histórico dos avanços na neurologia, com a incorporação de tecnologias como a tomografia computadorizada e a ressonância magnética, e enfatizou a necessidade de o Brasil capacitar mais profissionais. “Nenhuma ferramenta é melhor do que a mão que as manipula. Temos de ter bons centros de treinamento”, enfatizou.

 Conitec – Em seguida, o diretor do Departamento de Incorporação de Novas Tecnologias (DGITS) da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), Artur Felipe Siqueira de Brito, explicou como é o processo para a aceitação de um novo medicamento, tratamento ou exame para o SUS. “Levamos em conta critérios clínicos, econômicos, organizacionais e de benefícios para o paciente, sempre levando em conta as evidências científicas disponíveis”, explicou.  O representante da Conitec afirmou que no caso de algumas doenças neurológicas, principalmente as consideradas raras, não é possível a realização de evidências randomizadas, sendo usados outros critérios. A apresentação do diretor da Conitec pode ser lida aqui.

A visão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sobre a incorporação de novos procedimentos, foi repassada pelo diretor da Diare, Alessandro Ferreira do Nascimento. “Trabalhamos sob o binômio eficácia versus segurança, mas a aceitação de um medicamento pelo sistema público, por exemplo, é mais complexa e leva em conta outros fatores”, ressaltou. Assim como a Conitec, a Anvisa é um órgão reativo, precisa ser provocada para que possa começar a avaliar a viabilidade de incorporação de um novo procedimento.

A cada dois anos, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) revisa o Rol de Procedimentos em Saúde, que passará a constar das coberturas dos planos de saúde. “Avaliamos os dados epidemiológicos, os impactos financeiros, a segurança do paciente, o comparativo com os procedimentos já disponíveis e a existência de mão de obra qualificada”, explicou a médica Raquel Medeiros Lisbôa, gerente geral de Regulação Assistencial da Agência.

Segundo a gestora, as sociedades de especialidade, por meio da Associação Médica Brasileira, são muito ativas no encaminhamento de demandas. “E é natural que seja assim, pois é o médico que está no atendimento que tem a sensibilidade e o conhecimento para saber o que de melhor pode ser oferecido ao seu paciente”, afirmou. Raquel Lisbôa ponderou, no entanto, que nem todo o conhecimento disponibilizado pela ciência pode usado, pois os recursos são finitos, até nos países ricos. A apresentação da representante da ANS pode ser lida aqui.

Judicialização – A última palestra foi do desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Miguel Ângelo Brandi Junior, que ao falar sobre a visão do judiciário, ressaltou a necessidade de os médicos indicarem de forma precisa a necessidade da realização de determinado procedimento. “Apesar de a Súmula 96 estabelecer que, nos casos de expressa indicação médica, o plano não pode negar a cobertura de procedimento associados à enfermidade coberta pelo contrato, a interpretação da súmula não é simples, pois a indicação nem sempre é precisa, o que dificulta a decisão do juiz”, explicou. O desembargador orientou que os médicos descrevam quais foram as terapias já realizadas pelo paciente e o prontuário deve ser o mais completo possível.

“Para que o juiz tome uma decisão equilibrada ele precisa de subsídios, que só vocês, médicos, podem dar. Não adianta sermos donos de nossos saberes e continuarmos com eles. É preciso dialogar”, defendeu. Acesse, aqui, a apresentação do desembargador Miguel Ângelo.

O presidente do CFM, Carlos Vital, que falou no encerramento do Fórum, defendeu a autonomia do médico, ressaltando a necessidade de que as indicações sejam bem detalhadas para que a justiça seja feita. “Este é um fórum sobre novos procedimentos em neurologia e não sobre a  judicialização, mas não teríamos como fugir deste assunto, já que a Justiça geralmente é chamada a responder quando o paciente não consegue que o sistema de saúde, seja público ou suplementar, arque com um procedimento que ainda não é de uso corrente”, ponderou.

Como forma de contribuir para o diálogo proposto pelo desembargador Miguel Ângelo, o coordenador da Câmara Técnica de Neurologia e Neurologia e do Fórum, conselheiro Hideraldo Cabeça, adiantou que o CFM vai convidar entidades como a Anvisa, Conitec e ANS para participarem das discussões da Câmara Técnica. “Acreditamos que o diálogo é necessário e vamos começar a realizá-lo na nossa casa”, adiantou. O coordenador da Câmara Técnica do CFM também avaliou como positiva a disponilidade dos gestores dos três órgãos governamentais em consultarem o CFM sobre a incorporação de novos medicamentos e procedimentos.